segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

[APORIA]


Na fotografia que fiz, olhava o filho. O filho solto, imponente, pequeno diante das árvores, das montanhas longínquas, dos passantes e do batente de onde desceram para caminhar. No papel, o filho parado. Pose de herói de mãos empunhadas. O contemplava crescendo.  A vida vendo. Nada demais fazia além de estar no seu lugar no mundo. Desligou-se dali. Mascava um chiclete que não lhe deixava costurar memórias e sentimentos. Do filho pro nada. Num ponto fixo descansava o olhar e se via menino. Tudo e nada havia mudado. Se vira o menino: Pai. Oi. Até onde vai o mar?

Foto: Bárbara Marques

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015



[PERDIDA EM TRADUÇÃO]                                                                                          

Lembro
Ávida, feliz e silenciosa.
Em mim a memória
Deixou um lugar.
Nela entro para sonhar
Entro nela e
em nada mexo
olho-a atenta se
desenrolar.
Não me incomoda
Saber o que vem
no próximo milisegundo
posso vê-la
dum mundo
que já se reinventou.
Moro nela,
metadede mim.
Dela pego
o pólen da sobrevivência.
Choro nela
Digo que sim.
Nela me permito
viver a ausência.

***

[LOST IN TRANSLATION]

I remember
Avid, blissful and silent.
In me, memory
Has set a space.
I enter it to dream
I enter it and
I leave things untouched
I see it
unravel.
It is no trouble
Knowing what comes
the next millisecond
It can be seen
from a world
that has been reinvented.
I live in it,
half of me.
From it
I get the pollen of survival.
I cry for it
I say yes
In it I allow myself
loneliness.